Feriado do Dia da Consciência Negra

Em justa homenagem a Zumbi dos Palmares, um símbolo da resistência negra contra a escravidão, muitos municípios brasileiros instituíram como feriado o dia 20 de novembro, a exemplo de alguns municípios no Estado de São Paulo, como: São Paulo (Lei 14.485/07), Campinas (Lei 11.128/2002) e Guarulhos (Lei 5.950/2003).

A comemoração deve ser aplaudida.

Como consta do livro: “Brasil: Uma Biografia” (Lilia M. Schwarcz e Heloisa M. Starling, Companhia Das Letras, 2015, pág.15), “O Brasil recebeu 40% dos africanos que compulsoriamente deixaram seu continente para trabalhar nas colônias agrícolas da América portuguesa, sob regime de escravidão, num total de cerca de 3,8 milhões de imigrantes. Hoje, com 60% de sua população composta de pardos e negros, o Brasil pode ser considerado o segundo mais populoso país africano, depois da Nigéria.”

Ocorre que, com a publicação das leis municipais, empresas passaram a analisar e discutir a validade destes atos legislativos, especialmente acerca do reflexo na esfera trabalhista.

A dúvida é a seguinte: Os empregados estariam dispensados de comparecer ao trabalho ou, existindo a necessidade operacional da atividade, deveriam receber em dobro as horas laboradas?

Evidentemente, alguns segmentos discordam da instituição de mais um feriado, sob o argumento de elevação das despesas com pagamento de horas extras. Para outros, a exemplo do comércio, um dia de paralização nas atividades enseja a diminuição do movimento de vendas.

A Lei Federal nº 9.093/1995, em seu artigo 1º, prevê que são feriados civis:

I – os declarados em lei federal;

Tabela Feriados Nacionais
Tabela Feriados Nacionais

II – a data magna do Estado fixada em lei estadual;
III – os dias do início e do término do ano do centenário de fundação do Município, fixados em lei municipal.

No artigo 2º a lei acima esclarece: “São feriados religiosos os dias de guarda, declarados em lei municipal, de acordo com a tradição local e em número não superior a quatro, neste incluída a Sexta-Feira da Paixão.”

Assim, com amparo no artigo 2º, da Lei Federal nº 9093/1995, a questão começou a ser discutida na esfera judicial, sob o argumento de que os municípios estariam exorbitando sua competência ao instituir o Dia da Consciência Negra como feriado, uma vez que referida lei somente atribui aos municípios a competência para instituição de feriados religiosos e, assim mesmo, nunca superior a quatro, neste incluída a Sexta-Feira da Paixão.

No Tribunal Regional do Trabalho – 2ª Região (São Paulo) – encontramos posição favorável em reconhecer a competência municipal para decretar tal feriado, a exemplo das decisões proferidas nos processos 00004867520115020015 e 00000205420115020024.

Em síntese, as decisões acima se baseiam em dispositivos constitucionais previstos no artigo 30, incisos I e II, que atribuem ao município a competência para legislar sobre assuntos locais e suplementar legislação federal no que couber.

Em outros casos, contudo, no mesmo TRT de São Paulo, observamos decisões em sentido contrário, como as exaradas nos processos 02262.2007.082.02.00-3 e 01501.2008.080.02.00-6, as quais não reconhecem a competência do município para instituição do feriado tratado neste artigo, sob o fundamento de que compete privativamente à União legislar sobre direito do trabalho (CF/88, 22, I) e que ao município somente é reservado decretar feriados de caráter religioso, o que não seria o caso do Dia da Consciência Negra que tem um caráter civil.

A questão já foi discutida no Tribunal Superior do Trabalho.

No processo RR-2886-08.2012.5.02.0054, sendo reclamante um sindicato de trabalhadores contra determinada empresa, o TST decidiu pela constitucionalidade do feriado criado em São Paulo pela Lei Municipal nº 14.485/07, prescrevendo que “o Município tem a discricionariedade para instituir um feriado municipal prevista constitucionalmente, a partir da tradição e do referido interesse local”.

Na decisão o TST esclareceu, ainda, o seguinte: “Tampouco há falar em violação da Lei Federal nº 9.093/95, uma vez que não se pode definir o feriado “dia da consciência negra” como de caráter exclusivamente civil, despido de aspectos religiosos, conforme relatado pelo TRT, na medida em que o feriado revela parte da história do povo do município que homenageia o personagem Zumbi dos Palmares, líder escravo e símbolo da resistência negra contra a escravidão”.

Assim, o TST decidiu pela constitucionalidade da lei municipal, registrando que, se trabalhado, o feriado deve ser em dobro. Esta decisão reformou decisão que havia sido exarada no TRT de São Paulo em sentido oposto, que por sua vez havia reformado decisão de 1ª instância que havia reconhecido a constitucionalidade da lei municipal. Portanto, a decisão do TST confirmou a sentença dada em 1ª instância.

Na decisão o TST elencou outras jurisprudências no sentido da constitucionalidade de instituição de feriado da consciência negra em âmbito municipal, a exemplo das decisões proferidas nos processos TST-AIRR-174840-52.2007.5.15.0114 e TST-AIRR-94-02.2011.5.02.0027.

Portanto, é importante que as empresas analisem com cuidado a questão com vistas a evitar riscos. Aliás, sendo de seu interesse, aqui tem uma matéria interessante sobre prevenção de riscos (https://rogeriogomez.com.br/sua-empresa-previne-e-controla-riscos-trabalhistas/).

Por oportuno, vale mencionar que a Lei Federal nº 12.519/2011, embora não declare feriado, institui o dia 20 de novembro como o “Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra”, para fins comemorativos.

Na Câmara dos Deputados tramita o projeto de lei nº 296/2015, que institui o dia 20 de novembro, Dia da Consciência Negra, como feriado nacional, aguardando conclusão de pareceres das comissões.

Portanto, embora me pareça que ainda exista alguma dúvida sobre a legalidade da instituição do Dia da Consciência Negra como feriado por lei municipal, visto que tal comemoração não tem caráter religioso e sim civil, fato é que, pelo menos até o presente momento, a questão caminha no sentido de reconhecimento da legalidade de tais normas municipais, com os respectivos reflexos para fins trabalhistas, tal como configurar o feriado como um “Descanso Semanal Remunerado” e, uma vez trabalhado, nascer a responsabilidade empresarial na remuneração em dobro.

Rogério Gomez – Direito do Trabalho: Mais de 30 anos de dedicação, vivência, estudo e prática.
Site: www.rogeriogomez.com.br
E-mail: rogeriogomez@rogeriogomez.com.br

  1. 31 de março de 2017

    No entanto, atualmente, o Dia Nacional da Consciencia Negra e considerado feriado em mais de mil municipiosHistoria de ZumbiNo periodo do Brasil colonial, Zumbi simbolizou a luta do negro contra a escravidao que sofriam os brasileiros de etnia negra. Os quilombos, liderados por Zumbi, formavam a resistencia ao sistema escravocrata que vigorava, e eram os principais responsaveis pela preservacao da cultura africana no Brasil.

    • 9 de junho de 2017

      Sem dúvida a atuação política dele foi por demais importante.

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